As perguntas dos psiquiatras
e as respostas do Padre Gabriele
Amorth
1ª-
Pergunta –
Gostaria de saber se, na sua perspectiva, existem traços
típicos que caracterizam as pessoas que, mais tarde,
apresentam sintomas de possessão; ou seja, se, entre as
pessoas por si diagnosticadas como endemoninhadas, existiam
anteriormente comportamentos que as tornavam mais
vulneráreis? Ou se a possessão atinge as pessoas ao acaso.
Pergunto-lhe ainda se estes fenômenos de possessão também se
verificam em ateus ou declaradamente ateus. Uma última
curiosidade: já li qualquer coisa a respeito de perturbações
especificas ligadas a estes fenômenos, como, por exemplo, a
glossolalia (capacidade de falar em línguas desconhecidas)
ou a levitação. Já observou casos destes?
Resposta – São várias perguntas
interessantes. Começo pela última curiosidade. Sim, já
encontrei fenômenos de pessoas que durante os exorcismos
falavam outras línguas ou línguas estranhas; também
presenciei fenômenos de levitação e de força gigantesca.
Mas estes fenômenos sozinhos não são suficientes para poder
se afirmar se o caso é de possessão diabólica; são
necessárias condições especiais e a integração com outros
elementos de avaliação.
Um
exorcista está habituado a ver fenômenos estranhos em grande
quantidade e de tal maneira que se não os tivesse visto não
acreditaria neles. Como, por exemplo, pessoas que durante os
exorcismos cospem pregos, vidros, madeixas de cabelos, as
mais variadas coisas.
Ou,
então, a presença, em travesseiros ou colchões, de ferros
retorcidos, de cordas com nós, de trançados muito apertados
em forma de terço, de animais pré-históricos feitos de
material semelhante ao plástico... O caso mais grave que
estou acompanhando é o de uma pessoa de quem o demônio disse
que fará vomitar um aparelho de rádio; já vomitou quase dois
quilos de material.
Destaco que os objetos vomitados se materializam no instante
em que saem da boca.
Observei isso claramente num jovem que cuspiu pregos na mão;
até o último instante tive sempre a impressão de que cuspia
saliva. Assim se explica por que razão a pessoa nunca tem
danos físicos, mesmo quando cospe pedaços de vidro grosso e
cortante. São fenômenos paranormais. É importante levar em
conta a modalidade; certos objetos que encontramos nos
travesseiros são sinais evidentes de feitiços, ou seja, são
resultados de malefícios.
Respondo agora à primeira pergunta:
todas as pessoas podem ser atingidas pela possessão
diabólica de manifestação, principalmente os descrentes,
os ateus, os não praticantes, porque se encontram mais
indefesos.
E o
exorcista pode exorcizar quem quer que seja: aos meus
serviços, por exemplo, já recorreram muçulmanos, budistas,
pessoas sem qualquer tipo de credo religioso. Naturalmente,
ao pediram a cooperação necessária, me adapto de acordo com
a pessoa que tenho à minha frente: recomendo a cada qual que
siga com fidelidade a própria fé religiosa ou as suas
convicções morais.
Não existem predisposições dependentes, por
exemplo, a fragilidade do sistema nervoso ou a
hereditariedade. Pelo contrário, existe o perigo de
que uma pessoa se exponha à possessão diabólica, por
exemplo, freqüentando sessões de espiritismo ou seitas
satânicas. É importante saber que a possessão
diabólica não é um mal contagioso: não existe perigo algum,
nem para os familiares, nem para os lugares que freqüentam.
Pode se casar, ter filhos, sem nenhum perigo de contágio.
Podemos dizer, de um modo geral, que o demônio não pode nos
fazer nada sem o nosso consentimento.
Por
exemplo, veio me procurar uma moça que, por pura
curiosidade, tinha assistido a uma missa negra.
Não conseguia estudar, se concentrar e tinha crises
repentinas de violência, como nunca havia acontecido antes.
Neste caso, a causa era evidente e era uma causa
culpável.
A
respeito da culpabilidade, excetua-se o campo dos
malefícios, em que agora não me aprofundarei por ser um
campo bastante vasto e que foge do nosso tema principal.
Diga-me se respondi suficientemente a todas as suas
questões.
Pessoa que formulou a pergunta
-
Sim,
sinto-me satisfeito. (Esta é sempre a gentil declaração que
ouço após as minhas respostas, por isso, de agora em diante
não voltarei a repeti-la. Digo apenas, com a fraqueza que me
é habitual, que encontrei mais interesse e mais crédito ao
falar a estes grupos de psiquiatras, do que quando falo a
grupos de sacerdotes.)
2ª- Pergunta
–
Sobre algumas coisas, admito que estou de acordo com o padre
Amorth. Mas já não concordo em considerar equivalente, num
certo sentido, a Igreja e o manicômio: o primeiro,
como lugar do exorcismo contra o demônio, o outro, como
lugar da cura da loucura. Concordo que ambos trabalhem em
função do homem.
Procedo do positivismo médico; sou um descrente. Mas
acredito no homem, por isso, de um ou de outro modo,
trabalhamos para o mesmo fim; o senhor, padre, com o
exorcismo e nós, de outra maneira.
Os
psiquiatras, por vezes, foram acusados de não saberem fazer
a distinção entre uma alucinação, um efeito paranormal e um
estado de êxtase. É sempre bom esclarecermos, porque ninguém
tem o monopólio do saber. Vem à minha mente a frase de
Hamlet: “Existem mais coisas entre a terra e o céu do que as
que sonha a nossa vã filosofia”. Por isso que é sempre
necessário muita humildade.
Tenho que destacar a prudência que o padre Amorth
demonstra. Eu tenho uma paciente que foi ao seu encontro
porque supunha que estava possuída pelo demônio. Percorrendo
o itinerário que a tinha levado ao exorcista, tive
dificuldade em perceber por que razão o padre Amorth não a
tinha exorcizado, enviando-a, ao contrário, a um psiquiatra.
Depois, lentamente, fui percebendo a razão: existem duas
estradas a percorrer. A sua tarefa é a de expulsar os
demônios, a minha é a de reconstruir a pessoa. Esta
pessoa, que não é psicótica nem neurótica, teve necessidade
de passar pelo padre Amorth antes de chegar até mim. E
compreendo também a importância da fé. Todos nós
poderemos constatar que temos extrema facilidade em curar
pessoas que têm fé.
Alguns
dos casos mais difíceis que tratei foram, precisamente, de
casos de padres deprimidos. Gostaria de concluir
dizendo que existem seguramente pontos de contato entre o
exorcista e o psiquiatra, mas também entre o psiquiatra e o
médico tradicional.
Resposta – Obrigado pela sua
intervenção. Realmente é necessário mútua compreensão
para sermos ainda mais úteis para os doentes.
Descobrem-se mundos novos. Coisas difíceis de acreditar.
Certo dia, o padre Cândido estava exorcizando uma moça,
estudante universitária, que apresentava sintomas certos de
possessão diabólica, mas também sinais certos de
desequilíbrio psíquico.
O
padre Cândido pediu ajuda a um amigo e marcaram um encontro.
O psiquiatra tinha uma escrivaninha que era muito grande e,
por isso, a moça estava sentada à sua frente mas ainda
bastante distante. No fim da conversa, o psiquiatra disse a
ela: “Menina, vou receitar estes medicamentos para você”, e
começou a escrever a receita.
Nesse
momento, aconteceu um fato estranho. Sem se mexer da
cadeira, a moça esticou o braço, que ficou muito comprido
sob o olhar estupefato do psiquiatra (“quase dois metros”,
dirá ele mais tarde), pegou a receita que o médico estava
preenchendo, rasgou-a e atirou-a para o cesto de lixo
dizendo com voz profunda: “Esta porcaria não me serve
para nada”. O padre Cândido ria muito ao contar do susto
que tinha passado o seu amigo médico, que nunca mais quis
saber nada da moça, nem de nenhum outro paciente do
exorcista.
São fatos perante aos quais um exorcista não se
espanta, pois está constantemente acostumado a lidar com
eles. Mas é bom que também o psiquiatra os conheça para
poder intervir no âmbito que é de sua competência.
3ª- Pergunta-
Antes
de mais nada, quero agradecer ao padre Gabriele Amorth por
tudo o que nos disse. A minha pergunta é estritamente
técnica a respeito da função do psiquiatra nesses casos.
Gostaria de saber qual a responsabilidade individual destas
pessoas, que interesses tem o demônio; as causas que levam
uma pessoa ficar possuída pelo demônio.
Resposta – São três perguntas
muito interessantes e sinto ter de resumir as respostas em
tão pouco tempo. Começo pela última pergunta, que também
esclarece a primeira. São quatro as causas que podem levar à
possessão diabólica ou a perturbações de natureza maléfica;
duas causas são inculpáveis; por isso não existe
responsabilidade; duas causas são culpáveis; por isso a
responsabilidade humana é evidente.
A) Pode se tratar de simples permissão
de Deus, do mesmo modo como Deus pode permitir uma
determinada doença. A finalidade é dar à pessoa uma
oportunidade de purificação e de méritos. Poderia
apresentar uma longa lista de santos e de bem-aventurados
que sofreram períodos de possessão diabólica (Santa
Gemma Galgani, a bem-aventurada Ângela de Foligno, o
bem-aventurado Padre Calábria...). Pode se tratar
apenas de perturbações maléficas, tais como pancadas, quedas
ou coisas semelhantes; temos exemplos famosos deste tipo de
fenômenos na vida do Santo d’Ars e do Santo Padre Pio.
B)
A causa pode ser dada por um malefício de qual se é
vítima: não há culpa por parte da vítima, mas existe
culpa por parte de quem o provoca. Até mesmo a pessoa mais
inocente (por exemplo, um bebê ainda no seio materno) pode
ser atingida por um maléfico, que é definido como:
fazer mal por meio do demônio.
E pode
ser colocado em prática de muitas maneiras: feitiço, pactos,
maldições, mau-olhado, macumba... Aqui entramos no grande
campo da magia e da bruxaria, que nos levaria
para longe do nosso tema. Limito-me a dizer que Deus criou o
homem livre; livre até de fazer mal às outras pessoas.
Assim como posso pagar a um assassino para que mate uma
determinada pessoa, do mesmo modo posso pagar a um indivíduo
ligado ao demônio para que faça um malefício contra alguém.
C) Freqüentar pessoas e lugares
perigosos. Quem consulta magos, cartomantes, bruxos;
quem participa em sessões de espiritismo ou faz parte de
seitas satânicas; quem se dedica ao ocultismo, à necromancia
(mesmo sob a forma de psicografia, atualmente muito
difundida): todas estas pessoas se expõem ao risco
(embora na maior parte das vezes não sofra as conseqüências)
de receber influências maléficas e mesmo a possessão. É
evidente nestes casos a plena responsabilidade do
indivíduo, por vezes provocada com absurda vontade:
por exemplo, no caso do pacto de sangue com o diabo.
D) Também a quarta causa implica
plenamente a responsabilidade do indivíduo. Pode-se cair em
malefícios pela persistência, em culpas graves e
múltiplas. Creio que é o caso evangélico de Judas, de
quem se diz no fim: “Satanás entrou nele”.
Tive casos de jovens usuários de droga e sobretudo culpados
de delitos e perversões sexuais, culpas graves e
persistentes que os tornaram escravos do demônio.
Também já experimentei a grande dificuldade que é libertar
mulheres que, para além de outros motivos que tinham
provocado a possessão, tinham realizado abortos.
Respondo, enfim, a segunda questão:
que interesse tem o demônio. Nenhum interesse,
mas age por pura perfídia. É a verdadeira
falsidade demoníaca, que quer o mal pelo mal, mesmo em
próprio dano. Certo dia, interroguei um demônio:
“Você paga com um aumento de penas eternas todos os
sofrimentos que provocas a estas pessoas. Tem todo o
interesse em ir embora o mais rápido possível”.
Respondeu-me: “Não me interessam as penas que tenho de
sofrer; me basta fazer sofrer esta pessoa e destruí-la”.
Nós
podemos compreender, mesmo desaprovando, o delinqüente que
mata um homem para o derrubar. Mas nunca chegaremos a
compreender a perfídia do demônio que se encarniça contra o
homem, eventualmente com o objetivo de desprezar Deus,
travando os seus planos de felicidade e bem, mas em dano
próprio.
4ª- Pergunta –
Na minha longa
experiência sempre me abstive de fazer investigação como
curioso; procurei sempre, pelo contrario, manter-me
atualizado. Hoje vim aqui a convite do prezado Doutor Tamino;
e, no entanto, comecei a anotar muitas coisas e a surgirem
muitas dúvidas. Vou apresentar apenas algumas.
Antes
de tudo, está fora de questão que o psiquiatra, mais do que
todos os outros, tem de ter consciência dos enormes
limites da ciência. Lembro-me de um grande estudioso
francês que falava das vantagens da ignorância, ou seja, de
considerar-se ignorante; quando uma pessoa se considera
sábia não aprende mais nada.
Gostaria que me dissesse mais alguma coisa a respeito da
possessão e dos malefícios. E também a respeito da
colaboração que se requer do endemoninhado para que seja
curado, o que isso significa? Já tive experiência
destas possessões e gostaria de saber, também, a opinião dos
outros: é que entre as formas que já encontrei na minha vida
profissional e as que hoje aqui foram relatadas, há bem
pouco em comum.
Resposta – Muito obrigado.
Certamente que o pouco tempo disponível não permite
responder completamente a questões tão profundas. Aquilo que
relatei não combina com a sua experiência. Seria
interessante fazer uma comparação, porém, limito-me a uma
observação: os fatos naturais são caracterizados por uma
certa repetição que, no fim das contas, permite a formulação
de leis, de critérios, também em campo médico.
Deste
modo, a partir da experiência, nasce a ciência. Mas aqui
não. Não existem dois casos iguais. Mesmo entre exorcistas,
as experiências são de tal maneira diferente que por vezes é
difícil entendermos.
Mais algumas palavras a respeito da possessão,
que é a forma mais grave. O demônio é puro
espírito, na realidade, é uma força demoníaca que se apodera
de uma pessoa e fala ou age servindo-se dos órgãos desta
pessoa, mas valendo-se do seu conhecimento e força. Por isso
pode revelar coisas ocultas; pode falar todas as línguas ou
línguas que desconhecemos; pode manifestar uma força
extraordinária, impossível, humanamente falando.
Um
amigo, exorcista em Roma há muito tempo, estava exorcizando
um jovem numa Igreja. A certa altura, este jovem levantou-se
e começou a subir, a subir até que a sua cabeça tocou no
teto da Igreja. Imaginem o terror que experimentaram os que
presenciaram a cena, o medo de que o seu familiar caísse de
repente e se arrebentasse no chão. O exorcista fez um gesto
para tranqüilizá-los e continuou firme com o exorcismo, como
se nada de mais estivesse acontecendo.
Mais
para o fim das orações, aquele jovem começou a descer
lentamente e, no final do exorcismo, já estava de novo
sentado. Não percebeu nada. São fenômenos que
ocorreram, e que não podem ter explicação natural. Mais
difícil é verificar a relação com os malefícios.
Já a
Bíblia diz, no livro do Êxodo, quando descreve que os fatos
prodigiosos que Moisés realiza perante o Faraó, por ordem de
Deus e com a força de Deus, também são realizados
pelos magos, com a força do demônio:
transformar a água em sangue, o bastão em serpente, provocar
a invasão de rãs... O demônio também tem o
poder de provocar doenças.
Jesus curou muitos surdos e mudos, que tinham sido atingidos
por malefícios; certa vez, curou um surdo-mudo expulsando o
demônio que tinha se apoderado dele:
neste caso, o mal era resultante de uma presença
demoníaca.
O padre Cândido, com seus exorcismos, curou muitas doenças
e, até, tumores no cérebro.
Já me aconteceu, várias vezes, fazer desaparecer
cistos dos ovários, na véspera de uma operação.
Naturalmente que são fatos que ocorrem apenas a
pessoas já afetadas por malefícios.
O Evangelho sugere o critério: a árvore é conhecida pelos
frutos.
Até os médicos, muitas vezes, fazem experiências com os
medicamentos e percebem que, se um dá resultado positivo,
prosseguem com esse tratamento; caso contrário,
substituem-no. Eu costumo ser abrangente na
administração dos exorcismos e, depois, para avançar, me
prendo ao efeito provocado.
Uma palavra também sobre a colaboração que se
espera de uma pessoa possessa. Estamos em um campo no
qual a cura é a oração, é a
intervenção divina. Por isso, pedimos a quem é vítima
de malefícios que se reconcilie com
a lei de Deus (freqüentemente o ponto de partida
é uma boa confissão), que
intensifique a oração e a
freqüência aos sacramentos, que aprofunde a própria
cultura religiosa. E estes meios comuns da graça não são
apenas de ajuda; por vezes, são suficientes para fazerem
cessar as perturbações.
5ª-
Pergunta – Existem possessões mais ou menos
graves? O demônio pode dar poderes, benefícios?
Resposta – Existe uma vasta
série de possessões diabólicas, diferentes em
intensidade e em manifestações. Existe diferença de
intensidade.
Veio
me procurar, uma jovem de 15 anos, que há alguns dias
tinha ido assistir, por curiosidade, a um ritual satânico.
De volta para casa, ficou furiosa, dava pontapés e
arranhava os familiares que procuravam detê-la, cuspia neles.
Foram suficientes poucos minutos de exorcismos
para que fosse completamente libertada. Outras vezes,
somam-se várias causas, em diferentes idades da vida,
e quando a pessoa vem procurar o exorcista é
necessário sanar toda uma série de feridas,
exigindo, deste modo, um tratamento de muitos meses,
freqüentemente muitos anos, para atingir a plena libertação.
Existem também grandes diferenças nas
manifestações externas. Cito dois casos extremos. Há
pessoas que se tornam furiosas, com uma força sobre-humana,
gritam e procuram se atirar contra os presentes; contudo,
também já tive casos de absoluta imobilidade e silêncio, com
uma total falta de reações externas, que exigiram grande
esforço e a colaboração de muitos elementos para compreender
que se tratava realmente de uma possessão diabólica.
Entre estes casos extremos, há espaço para uma série de
variações intermediarias.
Outra
situação é a de quem consegue realizar completamente os seus
compromissos profissionais e familiares, e afazeres de
modo que ninguém tome conhecimento do seu mal; diferente
é a condição de quem não é capaz de fazer nada, de quem tem
necessidade de assistência contínua e, por isso, sente um
tédio mortal para com a vida.
Passando à outra pergunta: sim, o
demônio pode dar poder e benefícios. É o que faz, por
exemplo, com todos os magos e bruxos: o
poder da adivinhação e de provocar perturbações; pode
também dar vantagens materiais de riqueza, sucesso,
prazeres.
Mas
uma vez que o demônio apenas pode fazer mal e querer o mal,
combina sempre estes dons com grandes sofrimentos. Por isso,
aqueles que pedem dons a satanás fazem um péssimo negócio:
vivem o inferno já nesta terra e, se não se converterem,
irão vive-lo na outra vida também.
6ª-
Pergunta –
Vamos
dar um exemplo: uma pessoa possuída pelo demônio recebe um
mal físico que exige intervenção cirúrgica; quais são as
conseqüências?
- Pode
haver conflito entre um exorcista e um médico, com evidente
prejuízo ao paciente, se o exorcista considerar que se
encontra diante de um malefício, que pode ser curado com o
exorcismo, e o médico considerar, pelo contrário, que se
trata apenas de um mal natural, que deve ser curado por via
médica?
Resposta –
São
possíveis surpresas, mas não são possíveis conflitos entre
médicos e exorcistas. Esta, pelo menos, é minha experiência
pessoal e dos exorcistas que conheço.
Surpresas:
tive alguns casos nos quais o cirurgião, dando continuidade
aos preparativos para a operação, não encontrou nada
daqueles males que as análises, a ecografia, a TAC e a
ressonância magnética revelaram. Em todos os casos,
havia um mal (por exemplo, cistos), mas que surgiram
imediatamente após a operação. Mas são casos muito raros.
Já no
que diz respeito à possibilidade de conflito entre médicos e
exorcistas, nunca tive conhecimento de nenhum. Isto
porque, fundamentalmente, trabalham em campos diferentes.
Jamais me senti no direito de dizer a um médico o meu
parecer, ou de interferir nas decisões dele. Na maior parte
das vezes, tive casos em que suspeitava de malefícios
e esperava que se evitassem determinadas
intervenções cirúrgicas; e, de fato, ocorriam mudanças
nos dados das análises, o que levava os cirurgiões a
decidirem não intervir.
Posso
dizer que me encontrei muitas vezes a colaborar,
indiretamente, com os médicos, sem que nunca nos
encontrássemos e sem que eles soubessem da minha existência
ou do fato que o paciente recebia exorcismos realizados por
mim. Creio que este também é um importante ponto de
encontro, embora inconsciente: o respeito
mútuo que faz com que cada qual atue na própria
área de intervenção; e o encontro é dado pelas vantagens
que o doente recebe, sendo beneficiário tanto dos
cuidados médicos como da intervenção dos exorcistas.
7ª- Pergunta –
Uma
curiosidade pessoal. Gostaria de saber com que critérios de
escolha é que chegou a este tipo de atividade, e se sofreu
danos pessoais. E, antes ainda, gostaria de saber da
cultura, do ambiente onde vive; por exemplo, a comparação de
alguém que vive em Londres com alguém que vive em uma tribo
africana.
Resposta –
Considero muito importante fazer estas distinções.
A
cultura pessoal e o ambiente, mais ou menos avançado, em que
se vive, não têm nenhuma influência nem sobre as
eventuais perturbações, não têm nenhuma influência
nem sobre as eventuais perturbações, nem sobre os remédios
que as pessoas procuram nos exorcistas ou nos magos e nos
bruxos.
Tanto
nós, como eles, somos visitados por operários, agricultores,
domésticas, profissionais liberais, industriais,
políticos... Tive o caso de um engenheiro eletrônico que
tinha pago vinte mil euros por um amuleto (um
saquinho com um cordel cheio de nós), que devia tê-lo
libertado de todos os seus problemas.
O progresso técnico e a cultura não têm qualquer influência;
verificamos a existência deste fato por todo o lado: tanto
na Inglaterra como em Portugal, nos Estados Unidos como na
África ou na Índia.
Também a religião tem pouca influência e convive
tranquilamente com as várias formas de superstição,
embora as combata como pecados de idolatria.
As pessoas vão à igreja e depois à bruxaria, com a maior
naturalidade.
Sabemos que no mundo tecnicamente mais evoluído, a página
dos jornais diários mais lida é a do horóscopo;
foram feitas estatísticas bem precisas a este respeito.
Não
esqueçamos que a luta contra o demônio e contra os
espíritos maléficos foi sempre conduzida, junto de
todos os povos, ainda antes que existisse o povo judeu;
naturalmente que cada qual seguia as convicções e os métodos
do seu ambiente cultural.
O surgimento do cristianismo
e de outras grandes religiões tiveram escassa
influência na mudança da mentalidade.
Agora respondo à pergunta sobre como me
tornei exorcista. Foi por acaso; não foi uma escolha
minha. Tinha ido visitar o Cardeal Hugo Poletti, para
cumprimentá-lo e alegrá-lo um pouco com a minha maneira
brincalhona de ser, quando no meio da conversa surgiu o nome
do padre Cândido Amantini: Você conhece o
padre Cândido: Doente como está precisa mesmo de alguém
que o ajude”.
Começou a escrever numa folha (evidentemente que me
conferia a condição de exorcista), sem prestar
atenção aos meus protestos. Acrescento também que danos à
minha pessoa nunca sofri; trato o demônio com a
autoridade porque é ele que tem medo de mim e de qualquer
homem, criado à imagem de Deus. Muito mais,
tem medo de um cristão, que a partir do Batismo ficou com o
selo da Santíssima Trindade.
8ª- Pergunta –
Muitas pessoas falam demais sobre os demônios. Porque não
falar, igualmente, dos espíritos bons, já que também
existem?
Resposta – Você tem razão. O
demônio sempre se fez notícia; os anjos, pouco.
Recordo-me daquele provérbio chinês, que agora também está
de moda entre nós: “Faz mais barulho uma árvore que cai
do que uma floresta que cresce”.
Os
anjos existem, são muito mais ativos do que os
demônios e, na outra vida, poderemos verificar
de quantos perigos nos defenderam; até de
perigos materiais.
Quando
penso, por exemplo, nas imprudências e nos riscos que
consegui superar em quarenta anos da carta de habilitação,
conduzindo nem sempre da maneira mais correta, tenho
mesmo que agradecer ao meu anjo da guarda.
Mas tomar consciência do bem é mais difícil do que
percebermos o mal.
Até no campo dos males físicos: lamentamo-nos se temos um
mal (por exemplo, dor de dentes) e não pensamos em todos os
nossos órgãos que funcionam bem.
Agradeço à pergunta que me apresentou porque
me permite recordar que os anjos existem;
defendem-nos dos perigos, dão-nos boas inspirações,
ajudam-nos nas nossas atividades, apóiam-nos na adversidade.
É realmente injusto não falar mais sobre eles.
9ª- Pergunta –
Mais uma
pergunta sobre a ação do demônio. Certamente que não tem
interesse algum em encontrar-se com um exorcista. Gostaria
de saber se os endemoninhados vêm ao seu encontro
espontaneamente ou a força.
Resposta – A pessoa endemoninhada
sofre, e deseja ir ao encontro do exorcista para ser
curada, ou seja, libertada. Mas é verdade que
encontra dificuldades, especialmente no último momento. Em
muitos casos, se os atingidos não forem ajudados não
conseguem chegar ao exorcista.
Durante os exorcismos o demônio fica mais feroz do que em
qualquer outro momento. E então, antes de começar o
exorcismo, começam as perturbações. Há quem chegue até
mim serenamente e não apresente dificuldades iniciais; há
quem chegue até mim em estado de transe, tendo sido mesmo
arrastado a força durante a última parte do trajeto; há quem
gostaria de fugir enquanto espera pelo exorcismo, e fugiria
mesmo se não fosse agarrado. E há quem sai de casa para vir
se encontrar comigo, mas depois não consegue mudar a
direção.
Depois, e de um modo geral, no fim do exorcismo as pessoas
regressam as suas casas, serenas, contentes por terem vindo;
em todo o caso, mesmo percebendo as vantagens do exorcismo,
sentem tantas dores durante o desenrolar do ritual que
acabam até dizendo: “Aqui é que eu não volto mais!”
Mas, pelo contrário, são as pessoas mais fieis em regressar.
Acrescento que é muito importante o auxílio que
depois o possuído dá a si próprio (através
da oração, da freqüência aos sacramentos...)
ou que recebe dos outros: bênçãos, orações de
libertação, etc.
10ª- Pergunta –
Mas é assim, tão
importante, a colaboração da pessoa endemoninhada? Se há uma
presença externa que não depende dela, deveria poder ser
libertada.
Resposta – Sim, a colaboração é
muito importante. Eu costumo dizer, dado que já
quase toda gente tem experiência destas coisas, que é um
pouco como libertar um toxicodependente: se colaborar
pode chegar à cura, caso contrário, não.
Digo-o também ao interessado:
a luta e a vitória contra o demônio
é você quem a conduz; é você que se liberta, eu apenas posso
lhe ajudar. Porque aqui é necessário a
ajuda de Deus: quem liberta é o Senhor. E
obtém-se auxílio quando se reza e quando se afastam os
obstáculos a ação da graça: por uma injustiça grave que deve
ser reparada. Para
obter o auxílio de Deus a oração é fundamental.
Digo muitas vezes que o maior obstáculo que nós
exorcistas encontramos é a passividade das pessoas, a
pretensão de ser libertado sem o esforço próprio.
11ª- Pergunta – Gostaria de voltar à
tipologia de fenômenos de que se falou, como a glossolalia,
a levitação, etc. São fatos que me impressionam porque já
pude observá-los em outro contexto completamente diferente
do da possessão diabólica; encontramos exemplos destes
fenômenos na literatura psicanalítica.
Carl
Jung fala a este respeito e dá uma explicação em que formula
a hipótese de forças e energias que se libertam.
Parece-me que o Padre Amorth faz a distinção entre fenômenos
demoníacos, fenômenos paranormais e fenômenos psiquiátricos.
Esta distinção baseia-se numa evidente diferenciação
fenomenológica que, porém, possui igual substancialidade
energética, ou trata-se de uma diferenciação substancial em
que se liberta uma energia totalmente diferente, de outra
natureza?
Resposta – A diferença é substancial
porque há uma substancial diferença de causa.
Nos fenômenos de natureza maléfica, a causa é a
presença do demônio e a eventual energia que se
liberta provém do demônio. Por isso, só a
oração e os exorcismos não são eficazes e os males
continuam, quer dizer que a causa é diferente:
psíquica ou parapsicológica. Por isso, não se
trata de energias de intensidade diferente, mas de energias
de natureza diferente, de proveniência diferente.
12ª- Pergunta –
No caso que citou, do
levantamento de um grande peso, pareceu-me entender que na
sua perspectiva não existe uma diferente intensidade
de força, mas trata-se apenas de um fenômeno de natureza
diferente.
Resposta – Exato. Neste momento,
estamos perante a dificuldade que existe em catalogar
determinados fenômenos. Porque mesmo que a
fenomenologia seja idêntica, a causa pode ser
substancialmente diferente.
Foi por este motivo que citei o exemplo bíblico de Moisés
que, com a força de Deus,
realizava os mesmos prodígios que depois
dos magos egípcios realizavam com a força do diabo.
Podemos-nos encontrar perante dois fenômenos idênticos:
um de caráter maléfico e o outro de caráter
paranormal.
Como
podemos distinguir a causa que os diferencia? Antes de
mais a modalidade de manifestação. Por exemplo,
se uma pessoa manifesta uma força anormal apenas durante o
exorcismo. E, mais, se existem, eventualmente, outros
fenômenos suspeitos. Por exemplo, se a mesma pessoa,
durante os exorcismos, quando é aspergida com água-benta,
reage como se estivesse a ser queimada.
Certamente que isto não acontece com pessoas que estão
experimentando certos fenômenos de caráter parapsicológico.
Acrescento ainda: a eficácia dos meios de cura.
Se uma pessoa age sob a influência de poderes maléficos, os
exorcismo produzem efeito na pessoa, enquanto que as outras
curas de índole natural não produzem efeitos.
A ciência médica e os poderes parapsicológicos
(como a pranoterapia, por exemplo) influem sobre os
poderes naturais, mas não produzem qualquer efeito sobre os
maléficos. Também por isto se vê que a diferença é
substancial e não apenas fenomenológica.
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