quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Considerações sobre a possessão demoníaca: fato, farsa ou erro de identidade?!

Alguns afirmam que se trata de um fato que não pode ser negligenciado; ateístas falam em sugestão psicológica; parapsicólogos dizem que o mais comum é o erro de identidade, falar de doenças psicológicas e psiquiátricas sob a abrangência de supostas forças satânicas. Mas afinal de contas, o que podemos falar sobre esta parte tão controversa do monoteísmo, principalmente da contraparte cristã?
 1. Possessão demoníaca, ou simplesmente possessão, é o controle de um indivíduo por um ser maligno sobrenatural. Apesar de muito popular o termo no Cristianismo, ele está presente em quase todas as religiões estudadas pela antropologia;

2. De acordo com os estudiosos desses casos, antropólogos, teólogos, psiquiatras e parapsicólogos, tais descrições de possessões muitas vezes incluem memórias ou personalidades apagadas, convulsões e desmaios. Alguns relatos também incluem uma nova personalidade, como se um novo ser humano estivesse agindo sobre aquele, com voz diferente, por exemplo;

3. Outras descrições incluem o acesso ao conhecimento oculto (gnosis) e línguas estrangeiras (glossolalia), mudanças drásticas na entonação vocal e estrutura facial, o súbito aparecimento de lesões (arranhões, marcas de mordida) ou lesões e força sobre-humana;

4. Ao contrário da canalização mediúnica ou outras formas de possessão, o indivíduo não tem controle sobre a suposta entidade que o possui e por isso permanece nesse estado até que a entidade seja forçada a deixar a vítima, normalmente através de um exorcismo;

5. Alguns antropólogos chamam a atual onda de possessões demoníacas de “cultura demoníaca”, principalmente por onda das religiões protestantes neopentecostais, que abusam do conceito de possessão, e muitas vezes há erro de identidade no caso de problemas psiquiátricos, como o que ocorreu a Anneliese Michel (foto abaixo), que gerou o filme “O exorcismo de Emily Rose”;

 6. Muitas culturas e religiões contêm algum conceito de possessão demoníaca, mas os detalhes variam consideravelmente. As mais antigas referências à possessão demoníaca vêm dos sumérios, que acreditavam que todas as doenças do corpo e da mente eram causadas por “demônios de doenças” chamados “giddim”;

7. Os sacerdotes que praticavam exorcismos nessas nações eram chamados de “ashipu” (“feiticeiro”) em oposição a um “asu” (“médico”), que aplicava bandagens e pomadas. Muitas tábuas cuneiformes contêm orações para certos deuses pedindo proteção contra os demônios, enquanto outras pedem aos deuses para expulsar os demônios que invadiram seus corpos;

8. Culturas xamânicas também acreditam em possessões demoníacas e os xamãs realizam os exorcismos. Nessas culturas, as doenças são muitas vezes atribuídas à presença de um espírito vingativo (ou raramente chamado de demônio) no corpo do paciente. Estes espíritos eram mais frequentemente descritos como espectros de animais ou pessoas injustiçadas pelo portador, os ritos de exorcismo geralmente eram compostos de ofertas respeitosas ou ofertas de sacrifício;

9. O cristianismo afirma que a posse deriva do diabo, ou seja, satanás, ou de um de seus demônios. Em muitos sistemas de crença cristãos, satanás e seus demônios são descritos como anjos caídos;

10. A Bíblia apresenta vários casos de possessão demoníaca, como no Novo Testamento. Isto, provavelmente, foi uma influência trazida à religião judaica pelos anos de exílio na Babilônia, quando aprenderam com este povo o conceito dito anteriormente de “ashipu” e “giddim”;

11. As possessões demoníacas foram um grande terror na Europa e nas Américas durante os séculos 17 e 18. Muitas pessoas foram torturadas e queimadas vivas por conta de possíveis pactos com satanás. Exemplo disso é o clássico caso dos julgamentos de Salem, nos Estados Unidos;

12. A possessão demoníaca não é um diagnóstico psiquiátrico ou médico válido e reconhecido pelo DSM-4 e CID-10. Aqueles que professam a crença em possessões demoníacas por vezes descrevem sintomas que são comuns a várias doenças mentais, como histeria, mania, psicose, Síndrome de Tourette, epilepsia, esquizofrenia ou transtorno dissociativo de identidade;

13. Em casos de transtorno dissociativo de identidade em que a personalidade é questionada quanto à sua identidade, 29% são relatados como possessões de demônios. Além disso, há uma forma de monomania denominada “demoniomania” ou “demonopatia” em que o paciente acredita que está possuído por um ou mais demônios;

14. A ilusão de que o exorcismo funciona em pessoas com sintomas de possessão é atribuída por alguns ao efeito placebo e ao poder da sugestão. Algumas pessoas supostamente possuídas são realmente narcisistas ou sofrem de baixa autoestima e agem como uma “pessoa possuída por um demônio” com o propósito de ganhar atenção;

15. A história da medicina aponta que muitas doenças psiquiátricas foram confundidas como possessões ao longo do período bíblico e na Idade Média. Isso teria prejudicado, e muito, o desenvolvimento de tratamentos verdadeiros e aumentado o preconceito das pessoas portadoras de tais doenças, totalmente alijadas da sociedade. Somente mais recentemente que tais “possessões” começaram a ser analisadas com metodologia científica e passamos a contar com tratamentos médicos e medicamentos, mas nunca foi deixada de lado a crendice popular e religiosa das possíveis possessões;

 16. Historicamente, a possessão era considerada uma causa de loucura. Um dos livros mais clássicos, porém relegados por ter contexto religioso, é “A loucura sob novo prisma”, do médico homeopata e espírita Bezerra de Menezes;

17. No desenvolvimento da psiquiatra no Brasil esse tema também foi abordado, sobretudo pela escola baiana, sobretudo por Nina Rodrigues, que apesar da carga de preconceitos e patologização de manifestações religiosas (interpretando estas como manifestações epiléticas ou histéricas) conseguiu reunir e produzir considerável material etnográfico sobre as religiões africanas tendo como continuadores vultos como Estácio de Lima e Arthur Ramos;

18. A interpretação psicanalítica inaugurou uma forma de estudo até hoje válida, na perspectiva da relação entre o conteúdo religioso e manifestações criminosas. Pode-se tomar como marco dessa abordagem o trabalho de Sigmund Freud “Uma neurose demoníaca do século 17”, escrito em 1922;

19. Hoje em dia considera-se que a maioria dos casos de possessão demoníaca são distúrbios sociológicos, e não patológicos. Dalgalarrondo em estudo de revisão de trabalhos publicados desde o final do século 19 sobre messianismo, “loucura religiosa” e trabalhos contemporâneos relacionando religião, uso de álcool e drogas, além de algumas condições clínicas (esquizofrenia e suicídio), refere-se à ausência de uma linha de pesquisa que proporcione uma melhor articulação entre investigação empírica e análise teórica dos dados, assim como um diálogo mais próximo da psiquiatria com ciências sociais, como a antropologia e a sociologia da religião para um maior avanço nesta área;

20. Atualmente a possessão demoníaca é um assunto muito comum em religiões africanas e no ramo do Cristianismo relacionado ao pentecostalismo. Entretanto, psicanalistas dizem que essas possíveis possessões são histerias coletivas e sugestionamentos.

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