quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Babalon como a Deusa Heka

A palavra egípcia heka significa a ativação «he» do espírito «ka». Nos tempos antigos, antes das sociedades organizadas na forma de estado surgirem, homens e mulheres se organizavam em grupos nômades de característica aborígene. Nesse período, o papel do homem no processo de procriação era desconhecido e a mulher era tida como uma entidade sobrenatural: considerava-se que ela tinha o poder de jornar até o mundo dos espíritos, agarrar uma alma e trazê-la ao mundo dos vivos. A consciência humana era essencialmente ofidiana e animista. Não fazia-se distinção entre o mundo dos sonhos e a realidade.
 A mulher, portanto, tem o poder de trazer o Espírito da Vida, dotando o corpo com poder. Na construção do Santuário de Babalon, as mulheres têm de aprender a operar magicamente com este princípio feminino ou poder utilizando seu corpo: vagina, útero e menstruação em seus Ritos de Poder e práticas místicas na intenção de refiná-lo, manipulá-lo e direcioná-lo. Em O Livro da Lei, a Deusa Babalon diz:
 Agora, por esta razão, Eu sou conhecida por vós pelo meu nome Nuit, e por ele, por um secreto nome o qual Eu lhe darei quando, afinal ele conhecer-me. Desde que Eu sou Infinito Espaço, e as Infinitas Estrelas.
 No original em inglês, lê-se a última frase da citação acima assim: Since I am Infinite Space, and the Infinite Stars. Note que as letras iniciais em negrito formam o nome ISIS. Uma das mascaras de Babalon, portanto, é a deusa egípcia Ísis, Senhora da Magia e dos Encantramentos. Acreditava-se que Ísis era a própria incorporação do princípio feminine ou poder, heka.

No Atu II, a Alta Sacerdotisa está entronada, uma referência clara a deusa Ísis, da raiz istet que significa trono, o fundamento ou fundação da Lei divina. O Escorpião é um animal sagrado no culto de Ísis e é dito que as palavras mágicas de Ísis têm o poder de transmutar o veneno do Escorpião, quer dizer, a morte em vida.
 Ísis é uma rainha viúva. Este é um simbolismo extensivamente utilizado na maçonaria, cujos adeptos são chamados de Filhos da Viúva. O Véu da Viúva carrega uma correlação similar com o véu da Alta Sacerdotisa. Ísis é o ato da iniciação e da revelação. Ela revela quando seu véu é levantado. Existe um ditado hermético que diz que quando o véu da viúva é levantado ela profere encantamentos mortais e por conta disso, nenhum mortal foi capaz de levantar seu véu. Esse ditado invoca o simbolismo da morte no cruzamento do Abismo.
 Este caminho está em equilíbrio exato no Pilar do Meio. Palavras de Crowley ao descrever a Alta Sacerdotisa. Não apenas os dois pilares, negro e branco, estão em equilíbrio, mas acima de tudo, podemos dizer que o Superior e o Inferior estão em perfeita harmonia através da Alta Sacerdotisa.
 Quais as implicações sexuais que existem aqui quando Crowley descreve a Alta Sacerdotisa como virgem eterna? O véu da virgem pode ser inferido como o hímen, o que é bem congruente com o simbolismo da forma da vulva com a Rosa Mística. A virgindade sagrada, enquanto conectada ao simbolismo do hímen e da pureza relaciona-se ao ícone da iniciação nos mistérios e o acesso ao Santo dos Santos. Dessa maneira, a virgindade está conectada ao signo de Virgem como donzela, não a Mãe. Na Missa Gnóstica, a Alta Sacerdotisa é virgo intacta, o que lhe dá o direito de portar a Taça.
Todo esse simbolismo ocupou a mente de Crowley intensamente. Em seus diários ele escreve: Será a Carta G a Mulher na Porta? Sacerdotisa ou Prostituta? Ela é. Ela é a companheira sibilina das brincadeiras do Louco? O G é uma referência a letra Gimel (Alta Sacerdotisa) e a Porta uma referência a letra Daleth (Imperatriz). Caminhos que se cruzam nas Supernas.
 Nos Ritos Místicos de Babalon a Rosa Mística é deflorada. Mas é possível que a Alta Sacerdotisa permaneça virgem após a cópula?
 Pureza é viver somente para o Supremo; e o Supremo é Tudo; sê tu como Ártemis para Pã. Lê n’o Livro da Lei, e atravessa o véu da Virgem.
 É curioso que o entendimento primordial do termo virgem estivesse associado a idade certa para o casamento. A jovem era considerada virgem não por ainda não ter sido deflorada, mas por ainda não ter filhos. Dessa maneira, a Alta Sacerdotisa não é a Mãe em um sentido físico, como é a Imperatriz. Mas ao invés disso, ela é considerada a mãe mágica ou a boca mágica em essência, mãe dos deuses. Seus filhos são seus iniciados que renasceram ou se renovaram. Eles são, portanto, Bebês no Abismo ou Magister Templis.
 Babalon como a Deusa Heka, assim, é o poder que a Alta sacerdotisa manipula e dirige nas suas operações de magia. Ao se identificar com a Ísis, a Mulher Escarlate incorpora o poder da Boca de Deus, pois ela tem o poder de manifestar a vida através da vulva.





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