“Aqueles que acreditarem em Meu nome expulsarão os demônios...” (Mc 16,17): este poder que Jesus concedeu a todos os que crêem ainda permanece válido. É um poder geral baseado na Fé e na oração. Pode ser exercido individualmente ou na comunidade. É sempre possível e não requer nenhuma autorização. Fazemos aqui uma precisão de terminologia: neste caso trata-se de orações de libertação, não de exorcismos.
A fim de reforçar a eficácia deste poder conferido por Cristo, e de proteger os fiéis contra os charlatões e os mágicos, a Igreja instituiu um sacramental – o exorcismo – que só pode ser ministrado pelos bispos, ou pelos sacerdotes que tenham recebido dos bispos uma licença específica (portanto nunca pelos leigos).
É o que estabelece o direito canônico (can.1172) lembrando-nos igualmente como os sacramentais são apoiados pela força das orações de impetração da Igreja, diferentes das orações privadas (can. 1166), e deve ser administrado respeitando escrupulosamente os ritos e as fórmulas aprovadas pela Igreja (can. 1167).
A designação de exorcista só se aplica, portanto, aos sacerdotes autorizados e aos bispos exorcistas (se os houver!). É um nome inflacionado. Assiste-se atualmente a uma inflação neste domínio e fala-se de exorcistas a torto e a direito. Muitos sacerdotes e leigos, dizem-se exorcistas embora não sejam. E há muitas pessoas que afirmam fazer exorcismos, embora só façam orações de libertação, e até por vezes o que faz a magia... Só é exorcismo o sacramental instituído pela Igreja.
Esta denominação em qualquer outro caso é segundo o meu ponto de vista, muito equívoca e pode desorientar. É correto chamar exorcismo simples ao que está inserido no batismo e exorcismo solene ao Sacramental reservado aos exorcismos. É assim que se exprime o Novo Catecismo.
Parece-me incorreto qualificar de exorcismo privado ou vulgar uma oração que não é verdadeiramente um exorcismo, mas simplesmente uma oração de libertação, e que por isso, só deve ser denominado assim.
O exorcista deve-se orientar pelas orações do Ritual. O exorcismo apresenta uma diferença em relação aos outros sacramentais: pode durar alguns minutos ou prolongar-se por algumas horas. Portanto, não é necessário rezar todas as orações do Ritual e podem-se acrescentar muitas outras, conforme o próprio Ritual sugere.
O exorcismo visa um duplo objetivo. Propõe-se libertar os possessos; este aspecto é evidenciado em todos os livros dedicados a este assunto. Mas antes de tudo tem a finalidade de diagnosticar o mal; esta finalidade, no entanto, muitas vezes é ignorada.
É verdade que antes de atuar, o exorcista interroga a pessoa que sofre ou os seus familiares a fim de determinar se existem condições para administrar o exorcismo. Mas é igualmente verdadeiro que só mediante o exorcismo se pode saber com exatidão se existe uma intervenção diabólica ou não.
Todos os fenômenos que se produzem, ainda que sejam estranhos ou aparentemente inexplicáveis podem, com efeito, ter uma explicação natural. Mesmo a associação dos fenômenos psiquiátricos e parapsicológicos não é suficiente para estabelecer um diagnóstico. Só por meio do exorcismo é que se pode ter a certeza de estar perante uma intervenção diabólica ou não.
Neste ponto é necessário aprofundar um pouco mais um assunto que, infelizmente, não é sequer mencionado no Ritual e que é desconhecido daqueles que escreveram sobre esta questão.
Como já afirmamos, o exorcismo tem, sobretudo, um efeito de diagnóstico, quer dizer, permite verificar se os distúrbios de um individuo têm uma origem maléfica e se na verdade existe uma presença maléfica na pessoa.
Para seguir uma ordem, a primeira operação a fazer-se é esta, embora o principal objetivo do exorcismo consista em libertar a vítima duma presença maléfica ou de perturbações maléficas. No entanto, é essencial ter em conta esta sucessão lógica (primeiro o diagnóstico e em seguida a cura) a fim de avaliar corretamente os sinais com base nos quais os exorcista se deve fundamentar.
Podemos afirmar que os sinais verificados antes, durante e depois do exorcismo, assim como a evolução dos sinais no seguimento dos diferentes exorcismos, são dados muito importantes.
Parece-me que o Ritual, ainda que o faça de formas indireta, concede uma certa importância a esta sucessão uma vez que dedica uma norma (nº3) a prevenir o exorcista de que uma presença demoníaca não se revela facilmente; dedica várias regras com vista a prevenir o exorcista dos diferentes truques empregues pelo demônio para esconder a sua presença.
Nós, os exorcistas, pensamos que é justo e importante ter o cuidado de não nos deixarmos levar pelas ciladas dos doentes mentais, dos maníacos e de todos os que não têm nenhuma presença diabólica nem têm nenhuma necessidade de exorcismos.
No entanto é necessário igualmente assinalar o perigo inverso, que é cada vez mais freqüente e que devemos temer: o perigo de não saber reconhecer a presença maléfica e, por conseqüência, não recorrer ao exorcismo quando ele é necessário.
Eu, assim como todos os outros exorcistas a mais, mesmo sem ser necessário nunca fez mal (todos procedemos, na primeira vez e em casos de dúvida, por meio de exorcismos bastante breves pronunciados em voz baixa e susceptíveis de se confundir com simples bênçãos).
Por isso nunca tivemos ocasião de lamentar o fato de ter utilizado o exorcismo. Pelo contrário, sentimo-nos culpados dos casos em que omitimos o exorcismo, por não termos sabido reconhecer a presença do demônio, vindo-se este a manifestar mais tarde, através de sinais evidentes, numa altura em que essa presença já está muito mais arraigada.
Insisto, portanto, na importância e no valor dos sinais: não é necessário que sejam numerosos e indubitáveis para que se proceda a um exorcismo. Se durante o exorcismo novos sinais se manifestam, logicamente prolongar-se-á o tempo necessário, devendo contudo o primeiro exorcismo ser relativamente breve.
Pode acontecer que, durante o exorcismo não se manifeste nenhum sinal, mas que o paciente indique ao exorcista que sentiu efeitos notáveis (geralmente benéficos). Então o exorcista decide repetir o exorcismo; e, se estes efeitos persistem, acontece, seguramente, que mais tarde ou mais cedo também se manifestam sinais durante o exorcismo.
É muito útil observar a evolução dos sinais à medida que se efetuam os vários exorcismos. Uma baixa progressiva desses sinais corresponde a um início de cura, enquanto que, uma manifestação crescente, revestindo formas totalmente imprevisíveis, significa que está a aflorar o mal que estava escondido e que, só quando aflorar totalmente, é que começará a retroceder.
Compreende-se então agora como é disparate pensar que um exorcismo não se pode fazer senão em presença de sinais evidentes de possessão; contudo, também é fruto da total inexperiência, pensar que estes sinais se manifestam antes do exorcismo uma vez que, a maior parte das vezes, eles não aparecem senão durante ou no fim dum exorcismo, ou até mesmo depois de uma série de exorcismos.
Tive casos em que foram necessários anos de exorcismos para que o mal se revelasse em toda a sua gravidade. É inútil querer classificar os diferentes casos segundo modelos standard. Todo aquele que tem uma grande experiência neste domínio sabe, certamente, que as manifestações demoníacas revestem formas muito variadas.
Por exemplo: eu e todos os exorcistas com quem falei compreendemos um fato significativo: os três sinais indicados no Ritual como sintomas da possessão – falar línguas desconhecidas, possuir uma força sobre-humana, conhecer coisas ocultas, são sempre manifestações durante os exorcismos e nunca antes. Teria sido completamente disparato esperar que estes sinais se manifestassem para poder proceder aos exorcismos.
Acrescentemos que nem sempre é possível estabelecer um diagnóstico seguro. Há casos que nos deixam perplexos; os casos mais difíceis de resolver são aqueles em que nos encontramos confrontados com indivíduos com problemas psíquicos e influência maléfica ao mesmo tempo. Nestes casos é extremamente útil associar a ação do exorcista à do psiquiatra.
O Pe. Cândido chamou várias vezes o professor Mariani, médico chefe responsável de uma famosa clínica para doentes mentais em Roma, para assistir aos seus exorcismos; outras vezes, foi o professor Mariani que convidou o Pe. Cândido a ir à sua clínica para examinar e, eventualmente, colaborar na cura de certos pacientes.
Faz-me rir certos pretensiosos teólogos modernos que afirmam como sendo uma grande novidade o fato de certas doenças se poderem confundir com a possessão diabólica. Certos psiquiatras ou parapsicológicos estão nas mesmas circunstâncias: pensam ter descoberto a América ao proferir tais afirmações. Se fossem um pouco mais instruídos saberiam que as autoridades eclesiásticas foram as primeiras a pôr os teólogos de sobreaviso contra esse possível erro.
Nos decretos do Sínodo de Reims de 1583, a Igreja já tinha chamado a atenção para este possível equívoco afirmando que, certas manifestações, consideradas como sinais de possessão diabólica, poderiam com efeito ser apenas sintomas de doenças mentais. Nessa época, porém, a psiquiatria ainda não tinha nascido e os teólogos acreditavam no Evangelho.
Para além do diagnóstico, o exorcismo tem como objetivo curar e libertar os pacientes. É aí que se inicia um percurso muitas vezes difícil e longo. É indispensável que o sujeito colabore. E muitas vezes está impedido de o fazer; deve rezar muito e não consegue, tem de receber frequentemente os sacramentos e muitas vezes não é capaz; para chegar a um exorcista a fim de receber o sacramental tem por vezes que transportar obstáculos que parecem insuperáveis. Tem muita necessidade de ser ajudado e, ao contrário, na maior parte dos casos, não é compreendido por ninguém.
Quanto tempo é necessário para libertar uma pessoa que está sob o jugo do demônio? Ninguém pode responder a esta questão. É o Senhor quem liberta que age com a Sua divina liberdade, tendo também com certeza em contas as orações, especialmente as que lhe são dirigidas por intercessão da Igreja.
Duma maneira geral pode-se dizer que o tempo necessário à libertação depende da força inicial da possessão diabólica e do tempo que passou entre esta e o exorcismo.
Tive o caso de uma jovem de 14 anos, sob o julgo do demônio apenas há alguns dias, que parecia furiosa: dava pontapés, mordia, arranhava. Um quarto de hora de exorcismo foi o suficiente para a libertar completamente.
Numa primeira fase, caiu no chão, inanimada, de tal forma que me lembrei daquela passagem do Evangelho em que Jesus libertou aquele jovem que os Apóstolos não tinham conseguido libertar. Mas no fim de alguns minutos, a rapariga recuperou os sentidos e já corria no pátio brincando com o seu irmãozinho.
Este gênero de casos são raríssimos ou então acontecem quando a intervenção maléfica é muito ligeira. A maior parte das vezes o exorcista enfrenta situações penosas porque, geralmente, nunca ninguém pensa em levar logo ao exorcista.
Vejamos um caso típico: uma criança manifesta sinais estranhos; os pais não se questionam nem dão nenhuma importância pensando que com a idade tudo entrará na ordem. É preciso dizer que de início os sintomas são muito ligeiros. Depois, quando os fenômenos se agravam, os pais dirigem-se aos médicos: experimentam um, depois outro, sempre sem resultado.
Visitou-me uma rapariga de 17 anos que já tinha estado na Clínica mais famosa da Europa. Por fim, aconselhada por um amigo ou por um esperto qualquer que suspeitou não se tratar de um mal de origem natural, foi-lhe sugerido recorrer a um bruxo. A partir desse momento, o mal inicial multiplicou-se por dez.
Só por acaso e aconselhada não se sabe por quem (quase nunca por um padre...) recorreu a um exorcista. Só que, entretanto, já tinham decorrido vários anos e o mal tinha-se enraizado cada vez mais.
É por isso que justamente o primeiro exorcismo fala de desenraizar e pôr em fuga o demônio. Quando chega a este ponto, são necessários muitos exorcismos durante vários anos, e nem sempre se chega à libertação.
Entretanto repito: o tempo está nas mãos de Deus. A fé do exorcista e do exorcizado são um fator muito importante; ajudam também as orações do interessado, da sua família, de outras pessoas (religiosas de clausura, comunidades paroquiais, grupos de oração, especialmente aqueles grupos que fazem oração e libertação); ajuda muitíssimo o uso dos sacramentais previstos para este efeito, usados oportunamente para os fins indicados pelas orações de benção: água exorcizada, ou pelos menos benzida, óleo exorcizado, sal exorcizado.
Para exorcizar a água, o óleo, e o sal, não é indispensável a intervenção dum exorcista; qualquer sacerdote o pode fazer. Mas deve-se procurar um que acredite e que saiba que estas bênçãos específicas existem no Ritual. Os sacerdotes que estão ao corrente destas coisas contam-se pelos dedos; a maioria não as conhece e faz troça dos pedidos que lhes são feitos para este fim.
A freqüência aos sacramentos e uma conduta de vida conforme ao Evangelho são de uma importância capital. Pode-se constatar o poder do terço e, em geral, o recurso à Santa Virgem; a intercessão dos anjos e dos santos é muito poderosa; as peregrinações aos santuários que muitas vezes são os locais que Deus escolheu para a libertação preparada nos exorcismos, também são de extrema utilidade.
Deus ofereceu-nos variadíssimos instrumentos de graça; está nas nossas mãos fazer uso deles. Quando o Evangelho narra as tentações de Cristo por parte de Satanás, específica que Jesus responde sempre ao demônio tomando uma frase da Bíblia. A Palavra de Deus é de grande eficácia, assim como a oração de louvor, quer seja espontânea, quer seja retirada da Bíblia: os Salmos e os cânticos de louvor a Deus.
Apesar de tudo isto, a eficácia do exorcismo supõe sempre uma grande humildade da parte do exorcista, porque se apercebe do seu nada – quem opera é Deus. Além disso, o exorcista e o exorcizado são submetidos a rudes provas de desencorajamento; os resultados palpáveis são muitas vezes lentos e fatigantes.
Por outro lado observam-se grandes frutos espirituais que ajudam em parte a compreender porque é que o Senhor permite estas provas tão dolorosas. Caminha-se na obscuridade da fé, sabendo-se que vai em direção à verdadeira luz.
Lembremos a importância protetora das imagens santas, tanto usadas pela pessoa, como nos locais onde habita: na porta da casa, nos quartos, na sala de jantar ou onde a família se reúne habitualmente. A imagem santa sugere não a idéia pagã duma coisa que dá sorte, mas o conceito de imitação da figura representada e a proteção que se invoca.
Acontece-me muitas vezes entrar em casas que apresentam à entrada da porta um enorme corno, e depois percorrer as diversas divisões para as benzer e encontrar pouquíssimas imagens de santos; é um erro grave.
Lembremo-nos do exemplo de S. Bernardinho de Sena que cada vez que ia a casa de alguém, persuadia as famílias a colocar sobre a porta um medalhão com a sigla do nome de Jesus (JHS, que quer dizer: Jesus Hominum Salvador, Jesus Salvador dos Homens).
Constatei em várias ocasiões a eficácia das medalhas que as pessoas usam com fé. Bastaria falar da Medalha Milagrosa difundida em milhares de exemplares no mundo depois da aparição da Virgem a Sta. Catarina de Labouré (em Paris, 1830); se falássemos das graças prodigiosas recebidas através dessa simples medalha, nunca mais acabaríamos. Há vários livros que mencionam estes fatos em detalhe.
Um dos episódios de possessão diabólica mais conhecido, relatado em várias obras, devido à documentação histórica exata que nos transmitiu esse fato, é a que se refere aos irmãos Burner, de Illfurt (Alsace) que foram libertados graças a uma série de exorcismos em 1869.
Um dia, entre as numerosas catástrofes ocasionadas pelo demônio, virou-se a carroça que transportava o exorcista, acompanhado por um monsenhor e uma religiosa. Mas o demônio não conseguiu levar o seu projeto até o fim porque, no momento da partida tinha sido dada ao cocheiro, para proteção, uma medalha de S. Bento que ele tinha guardado no bolso com grande devoção.
Por fim lembro os quatro parágrafos que o Catecismo da Igreja Católica dedica aos exorcismos. Lidas em seqüência, oferecem um desenvolvimento bem ordenado.
> No nº 517, falando de Cristo Redentor, recorda as Suas curas e os Seus exorcismos. O ponto de partida é o que Jesus fez.
> No nº 550, afirma que a vinda do Reino de Deus assinala o fim do Reino de Satanás; vêm referidas as palavras de Jesus: Se Eu expulso os demônios por virtude do Espírito de Deus, é porque chegou à vós o Reino de Deus. É esta a finalidade dos exorcismos; com a libertação dos endemoninhados é demonstrada a vitória total de Cristo sobre o príncipe deste mundo.
Os dois parágrafos seguintes especificam a dupla utilização seguida nos exorcismos: como uma componente no Batismo e como poder de libertação dos possessos.
> No nº 1237, recorda-se que, uma vez que o Batismo liberta do pecado e da escravidão de Satanás, durante o ritual é pronunciado um ou mais exorcismos sobre o candidato que, explicitamente, renuncia a Satanás.
> No nº 1673, afirma que, como o exorcismo, a Igreja pede publicamente e com autoridade, em nome de Jesus Cristo, que uma pessoa ou um objeto sejam protegidos contra a influência do Maligno e sejam subtraídos ao seu domínio. O exorcismo tem como objetivo expulsar os demônios ou libertar da influência demoníaca.
Chamo a atenção para a importância deste parágrafo que preenche duas lacunas existentes no Ritual e no Direito Canônico. Na verdade não fala apenas em libertar as pessoas, mas também os objetos (termo genérico que pode abranger casas, animais, coisas, de acordo com a tradição). Por outro lado, aplica o exorcismo não só à possessão, mas também à influência demoníaca.
A fim de reforçar a eficácia deste poder conferido por Cristo, e de proteger os fiéis contra os charlatões e os mágicos, a Igreja instituiu um sacramental – o exorcismo – que só pode ser ministrado pelos bispos, ou pelos sacerdotes que tenham recebido dos bispos uma licença específica (portanto nunca pelos leigos).
É o que estabelece o direito canônico (can.1172) lembrando-nos igualmente como os sacramentais são apoiados pela força das orações de impetração da Igreja, diferentes das orações privadas (can. 1166), e deve ser administrado respeitando escrupulosamente os ritos e as fórmulas aprovadas pela Igreja (can. 1167).
A designação de exorcista só se aplica, portanto, aos sacerdotes autorizados e aos bispos exorcistas (se os houver!). É um nome inflacionado. Assiste-se atualmente a uma inflação neste domínio e fala-se de exorcistas a torto e a direito. Muitos sacerdotes e leigos, dizem-se exorcistas embora não sejam. E há muitas pessoas que afirmam fazer exorcismos, embora só façam orações de libertação, e até por vezes o que faz a magia... Só é exorcismo o sacramental instituído pela Igreja.
Esta denominação em qualquer outro caso é segundo o meu ponto de vista, muito equívoca e pode desorientar. É correto chamar exorcismo simples ao que está inserido no batismo e exorcismo solene ao Sacramental reservado aos exorcismos. É assim que se exprime o Novo Catecismo.
Parece-me incorreto qualificar de exorcismo privado ou vulgar uma oração que não é verdadeiramente um exorcismo, mas simplesmente uma oração de libertação, e que por isso, só deve ser denominado assim.
O exorcista deve-se orientar pelas orações do Ritual. O exorcismo apresenta uma diferença em relação aos outros sacramentais: pode durar alguns minutos ou prolongar-se por algumas horas. Portanto, não é necessário rezar todas as orações do Ritual e podem-se acrescentar muitas outras, conforme o próprio Ritual sugere.
O exorcismo visa um duplo objetivo. Propõe-se libertar os possessos; este aspecto é evidenciado em todos os livros dedicados a este assunto. Mas antes de tudo tem a finalidade de diagnosticar o mal; esta finalidade, no entanto, muitas vezes é ignorada.
É verdade que antes de atuar, o exorcista interroga a pessoa que sofre ou os seus familiares a fim de determinar se existem condições para administrar o exorcismo. Mas é igualmente verdadeiro que só mediante o exorcismo se pode saber com exatidão se existe uma intervenção diabólica ou não.
Todos os fenômenos que se produzem, ainda que sejam estranhos ou aparentemente inexplicáveis podem, com efeito, ter uma explicação natural. Mesmo a associação dos fenômenos psiquiátricos e parapsicológicos não é suficiente para estabelecer um diagnóstico. Só por meio do exorcismo é que se pode ter a certeza de estar perante uma intervenção diabólica ou não.
Neste ponto é necessário aprofundar um pouco mais um assunto que, infelizmente, não é sequer mencionado no Ritual e que é desconhecido daqueles que escreveram sobre esta questão.
Como já afirmamos, o exorcismo tem, sobretudo, um efeito de diagnóstico, quer dizer, permite verificar se os distúrbios de um individuo têm uma origem maléfica e se na verdade existe uma presença maléfica na pessoa.
Para seguir uma ordem, a primeira operação a fazer-se é esta, embora o principal objetivo do exorcismo consista em libertar a vítima duma presença maléfica ou de perturbações maléficas. No entanto, é essencial ter em conta esta sucessão lógica (primeiro o diagnóstico e em seguida a cura) a fim de avaliar corretamente os sinais com base nos quais os exorcista se deve fundamentar.
Podemos afirmar que os sinais verificados antes, durante e depois do exorcismo, assim como a evolução dos sinais no seguimento dos diferentes exorcismos, são dados muito importantes.
Parece-me que o Ritual, ainda que o faça de formas indireta, concede uma certa importância a esta sucessão uma vez que dedica uma norma (nº3) a prevenir o exorcista de que uma presença demoníaca não se revela facilmente; dedica várias regras com vista a prevenir o exorcista dos diferentes truques empregues pelo demônio para esconder a sua presença.
Nós, os exorcistas, pensamos que é justo e importante ter o cuidado de não nos deixarmos levar pelas ciladas dos doentes mentais, dos maníacos e de todos os que não têm nenhuma presença diabólica nem têm nenhuma necessidade de exorcismos.
No entanto é necessário igualmente assinalar o perigo inverso, que é cada vez mais freqüente e que devemos temer: o perigo de não saber reconhecer a presença maléfica e, por conseqüência, não recorrer ao exorcismo quando ele é necessário.
Eu, assim como todos os outros exorcistas a mais, mesmo sem ser necessário nunca fez mal (todos procedemos, na primeira vez e em casos de dúvida, por meio de exorcismos bastante breves pronunciados em voz baixa e susceptíveis de se confundir com simples bênçãos).
Por isso nunca tivemos ocasião de lamentar o fato de ter utilizado o exorcismo. Pelo contrário, sentimo-nos culpados dos casos em que omitimos o exorcismo, por não termos sabido reconhecer a presença do demônio, vindo-se este a manifestar mais tarde, através de sinais evidentes, numa altura em que essa presença já está muito mais arraigada.
Insisto, portanto, na importância e no valor dos sinais: não é necessário que sejam numerosos e indubitáveis para que se proceda a um exorcismo. Se durante o exorcismo novos sinais se manifestam, logicamente prolongar-se-á o tempo necessário, devendo contudo o primeiro exorcismo ser relativamente breve.
Pode acontecer que, durante o exorcismo não se manifeste nenhum sinal, mas que o paciente indique ao exorcista que sentiu efeitos notáveis (geralmente benéficos). Então o exorcista decide repetir o exorcismo; e, se estes efeitos persistem, acontece, seguramente, que mais tarde ou mais cedo também se manifestam sinais durante o exorcismo.
É muito útil observar a evolução dos sinais à medida que se efetuam os vários exorcismos. Uma baixa progressiva desses sinais corresponde a um início de cura, enquanto que, uma manifestação crescente, revestindo formas totalmente imprevisíveis, significa que está a aflorar o mal que estava escondido e que, só quando aflorar totalmente, é que começará a retroceder.
Compreende-se então agora como é disparate pensar que um exorcismo não se pode fazer senão em presença de sinais evidentes de possessão; contudo, também é fruto da total inexperiência, pensar que estes sinais se manifestam antes do exorcismo uma vez que, a maior parte das vezes, eles não aparecem senão durante ou no fim dum exorcismo, ou até mesmo depois de uma série de exorcismos.
Tive casos em que foram necessários anos de exorcismos para que o mal se revelasse em toda a sua gravidade. É inútil querer classificar os diferentes casos segundo modelos standard. Todo aquele que tem uma grande experiência neste domínio sabe, certamente, que as manifestações demoníacas revestem formas muito variadas.
Por exemplo: eu e todos os exorcistas com quem falei compreendemos um fato significativo: os três sinais indicados no Ritual como sintomas da possessão – falar línguas desconhecidas, possuir uma força sobre-humana, conhecer coisas ocultas, são sempre manifestações durante os exorcismos e nunca antes. Teria sido completamente disparato esperar que estes sinais se manifestassem para poder proceder aos exorcismos.
Acrescentemos que nem sempre é possível estabelecer um diagnóstico seguro. Há casos que nos deixam perplexos; os casos mais difíceis de resolver são aqueles em que nos encontramos confrontados com indivíduos com problemas psíquicos e influência maléfica ao mesmo tempo. Nestes casos é extremamente útil associar a ação do exorcista à do psiquiatra.
O Pe. Cândido chamou várias vezes o professor Mariani, médico chefe responsável de uma famosa clínica para doentes mentais em Roma, para assistir aos seus exorcismos; outras vezes, foi o professor Mariani que convidou o Pe. Cândido a ir à sua clínica para examinar e, eventualmente, colaborar na cura de certos pacientes.
Faz-me rir certos pretensiosos teólogos modernos que afirmam como sendo uma grande novidade o fato de certas doenças se poderem confundir com a possessão diabólica. Certos psiquiatras ou parapsicológicos estão nas mesmas circunstâncias: pensam ter descoberto a América ao proferir tais afirmações. Se fossem um pouco mais instruídos saberiam que as autoridades eclesiásticas foram as primeiras a pôr os teólogos de sobreaviso contra esse possível erro.
Nos decretos do Sínodo de Reims de 1583, a Igreja já tinha chamado a atenção para este possível equívoco afirmando que, certas manifestações, consideradas como sinais de possessão diabólica, poderiam com efeito ser apenas sintomas de doenças mentais. Nessa época, porém, a psiquiatria ainda não tinha nascido e os teólogos acreditavam no Evangelho.
Para além do diagnóstico, o exorcismo tem como objetivo curar e libertar os pacientes. É aí que se inicia um percurso muitas vezes difícil e longo. É indispensável que o sujeito colabore. E muitas vezes está impedido de o fazer; deve rezar muito e não consegue, tem de receber frequentemente os sacramentos e muitas vezes não é capaz; para chegar a um exorcista a fim de receber o sacramental tem por vezes que transportar obstáculos que parecem insuperáveis. Tem muita necessidade de ser ajudado e, ao contrário, na maior parte dos casos, não é compreendido por ninguém.
Quanto tempo é necessário para libertar uma pessoa que está sob o jugo do demônio? Ninguém pode responder a esta questão. É o Senhor quem liberta que age com a Sua divina liberdade, tendo também com certeza em contas as orações, especialmente as que lhe são dirigidas por intercessão da Igreja.
Duma maneira geral pode-se dizer que o tempo necessário à libertação depende da força inicial da possessão diabólica e do tempo que passou entre esta e o exorcismo.
Tive o caso de uma jovem de 14 anos, sob o julgo do demônio apenas há alguns dias, que parecia furiosa: dava pontapés, mordia, arranhava. Um quarto de hora de exorcismo foi o suficiente para a libertar completamente.
Numa primeira fase, caiu no chão, inanimada, de tal forma que me lembrei daquela passagem do Evangelho em que Jesus libertou aquele jovem que os Apóstolos não tinham conseguido libertar. Mas no fim de alguns minutos, a rapariga recuperou os sentidos e já corria no pátio brincando com o seu irmãozinho.
Este gênero de casos são raríssimos ou então acontecem quando a intervenção maléfica é muito ligeira. A maior parte das vezes o exorcista enfrenta situações penosas porque, geralmente, nunca ninguém pensa em levar logo ao exorcista.
Vejamos um caso típico: uma criança manifesta sinais estranhos; os pais não se questionam nem dão nenhuma importância pensando que com a idade tudo entrará na ordem. É preciso dizer que de início os sintomas são muito ligeiros. Depois, quando os fenômenos se agravam, os pais dirigem-se aos médicos: experimentam um, depois outro, sempre sem resultado.
Visitou-me uma rapariga de 17 anos que já tinha estado na Clínica mais famosa da Europa. Por fim, aconselhada por um amigo ou por um esperto qualquer que suspeitou não se tratar de um mal de origem natural, foi-lhe sugerido recorrer a um bruxo. A partir desse momento, o mal inicial multiplicou-se por dez.
Só por acaso e aconselhada não se sabe por quem (quase nunca por um padre...) recorreu a um exorcista. Só que, entretanto, já tinham decorrido vários anos e o mal tinha-se enraizado cada vez mais.
É por isso que justamente o primeiro exorcismo fala de desenraizar e pôr em fuga o demônio. Quando chega a este ponto, são necessários muitos exorcismos durante vários anos, e nem sempre se chega à libertação.
Entretanto repito: o tempo está nas mãos de Deus. A fé do exorcista e do exorcizado são um fator muito importante; ajudam também as orações do interessado, da sua família, de outras pessoas (religiosas de clausura, comunidades paroquiais, grupos de oração, especialmente aqueles grupos que fazem oração e libertação); ajuda muitíssimo o uso dos sacramentais previstos para este efeito, usados oportunamente para os fins indicados pelas orações de benção: água exorcizada, ou pelos menos benzida, óleo exorcizado, sal exorcizado.
Para exorcizar a água, o óleo, e o sal, não é indispensável a intervenção dum exorcista; qualquer sacerdote o pode fazer. Mas deve-se procurar um que acredite e que saiba que estas bênçãos específicas existem no Ritual. Os sacerdotes que estão ao corrente destas coisas contam-se pelos dedos; a maioria não as conhece e faz troça dos pedidos que lhes são feitos para este fim.
A freqüência aos sacramentos e uma conduta de vida conforme ao Evangelho são de uma importância capital. Pode-se constatar o poder do terço e, em geral, o recurso à Santa Virgem; a intercessão dos anjos e dos santos é muito poderosa; as peregrinações aos santuários que muitas vezes são os locais que Deus escolheu para a libertação preparada nos exorcismos, também são de extrema utilidade.
Deus ofereceu-nos variadíssimos instrumentos de graça; está nas nossas mãos fazer uso deles. Quando o Evangelho narra as tentações de Cristo por parte de Satanás, específica que Jesus responde sempre ao demônio tomando uma frase da Bíblia. A Palavra de Deus é de grande eficácia, assim como a oração de louvor, quer seja espontânea, quer seja retirada da Bíblia: os Salmos e os cânticos de louvor a Deus.
Apesar de tudo isto, a eficácia do exorcismo supõe sempre uma grande humildade da parte do exorcista, porque se apercebe do seu nada – quem opera é Deus. Além disso, o exorcista e o exorcizado são submetidos a rudes provas de desencorajamento; os resultados palpáveis são muitas vezes lentos e fatigantes.
Por outro lado observam-se grandes frutos espirituais que ajudam em parte a compreender porque é que o Senhor permite estas provas tão dolorosas. Caminha-se na obscuridade da fé, sabendo-se que vai em direção à verdadeira luz.
Lembremos a importância protetora das imagens santas, tanto usadas pela pessoa, como nos locais onde habita: na porta da casa, nos quartos, na sala de jantar ou onde a família se reúne habitualmente. A imagem santa sugere não a idéia pagã duma coisa que dá sorte, mas o conceito de imitação da figura representada e a proteção que se invoca.
Acontece-me muitas vezes entrar em casas que apresentam à entrada da porta um enorme corno, e depois percorrer as diversas divisões para as benzer e encontrar pouquíssimas imagens de santos; é um erro grave.
Lembremo-nos do exemplo de S. Bernardinho de Sena que cada vez que ia a casa de alguém, persuadia as famílias a colocar sobre a porta um medalhão com a sigla do nome de Jesus (JHS, que quer dizer: Jesus Hominum Salvador, Jesus Salvador dos Homens).
Constatei em várias ocasiões a eficácia das medalhas que as pessoas usam com fé. Bastaria falar da Medalha Milagrosa difundida em milhares de exemplares no mundo depois da aparição da Virgem a Sta. Catarina de Labouré (em Paris, 1830); se falássemos das graças prodigiosas recebidas através dessa simples medalha, nunca mais acabaríamos. Há vários livros que mencionam estes fatos em detalhe.
Um dos episódios de possessão diabólica mais conhecido, relatado em várias obras, devido à documentação histórica exata que nos transmitiu esse fato, é a que se refere aos irmãos Burner, de Illfurt (Alsace) que foram libertados graças a uma série de exorcismos em 1869.
Um dia, entre as numerosas catástrofes ocasionadas pelo demônio, virou-se a carroça que transportava o exorcista, acompanhado por um monsenhor e uma religiosa. Mas o demônio não conseguiu levar o seu projeto até o fim porque, no momento da partida tinha sido dada ao cocheiro, para proteção, uma medalha de S. Bento que ele tinha guardado no bolso com grande devoção.
Por fim lembro os quatro parágrafos que o Catecismo da Igreja Católica dedica aos exorcismos. Lidas em seqüência, oferecem um desenvolvimento bem ordenado.
> No nº 517, falando de Cristo Redentor, recorda as Suas curas e os Seus exorcismos. O ponto de partida é o que Jesus fez.
> No nº 550, afirma que a vinda do Reino de Deus assinala o fim do Reino de Satanás; vêm referidas as palavras de Jesus: Se Eu expulso os demônios por virtude do Espírito de Deus, é porque chegou à vós o Reino de Deus. É esta a finalidade dos exorcismos; com a libertação dos endemoninhados é demonstrada a vitória total de Cristo sobre o príncipe deste mundo.
Os dois parágrafos seguintes especificam a dupla utilização seguida nos exorcismos: como uma componente no Batismo e como poder de libertação dos possessos.
> No nº 1237, recorda-se que, uma vez que o Batismo liberta do pecado e da escravidão de Satanás, durante o ritual é pronunciado um ou mais exorcismos sobre o candidato que, explicitamente, renuncia a Satanás.
> No nº 1673, afirma que, como o exorcismo, a Igreja pede publicamente e com autoridade, em nome de Jesus Cristo, que uma pessoa ou um objeto sejam protegidos contra a influência do Maligno e sejam subtraídos ao seu domínio. O exorcismo tem como objetivo expulsar os demônios ou libertar da influência demoníaca.
Chamo a atenção para a importância deste parágrafo que preenche duas lacunas existentes no Ritual e no Direito Canônico. Na verdade não fala apenas em libertar as pessoas, mas também os objetos (termo genérico que pode abranger casas, animais, coisas, de acordo com a tradição). Por outro lado, aplica o exorcismo não só à possessão, mas também à influência demoníaca.
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